O que nos espera após greve dos caminhoneiros?

É quase que inevitável não comentarmos sobre a paralisação e/ou greve dos caminhoneiros, que tomou conta das ruas do Brasil nos últimos dias. É difícil encontrar alguém que não tenha sido impactado pela falta de combustível e da dificuldade no transporte. Mesmo que as reivindicações tenham sido originárias dos caminhoneiros, a população apoiou e aproveitou para politizar, protestar contra corrupção e contra o governo, além de claro, pedir uma redução de valor no combustível.

 

Acredito que é justo o manifesto e o total apoio da população à causa, visto que os valores dos combustíveis estão muito altos. Mas qual será o efeito a partir de agora na economia, visto que a greve está gradativamente finalizando?

 

Antes de tratar dos efeitos, é importante destacar o que ficou de positivo do movimento. Primeiramente a força da classe dos caminhoneiros, que se uniu e conseguiu muitas reivindicações, ainda que muitos não estejam satisfeitos. E ainda, acrescento o apoio da população, que tomou para si a causa, mesmo que alguns tenham se exaltado e aproveitado para pedir outras reivindicações. Também ficou claro a necessidade de rever o peso dos impostos sobre os combustíveis e a prática de reajuste de preço dos mesmos. Destaco ainda a noção que tivemos sobre a importância do transporte modal rodoviário para o país, onde realmente a famosa frase “Sem caminhão, o Brasil para”, teve efeito.

 

Ficou notável com esse movimento o quanto somos dependentes do petróleo. Ele é essencial para a estrutura que temos, e de certa forma faz parte da nossa vida. Também ficou evidente o quanto o transporte rodoviário prevalece sobre os demais, visto que historicamente foi o modelo preferido instituído pelo país. Mesmo que tenha projetos para fortalecer outros meios de transporte de cargas, ainda vai demorar um bom tempo para reduzir a dependência do modal rodoviário.

 

Mas quais os impactos da greve?

 

Se você é empreendedor, já deve estar apurando o tamanho do prejuízo com os dias parados, visto que com a falta de matéria-prima, a falta de pessoas, a impossibilidade de visitar clientes, entre outros fatores, fazem com que a operação fique prejudicada. Esses são os impactos imediatos e que já conseguimos apurar, mas eles ainda vão ser sentidos por muitos dias.

 

Entre as atividades que mais foram e ainda serão prejudicadas, estão aquelas que dependem diretamente do combustível ou do transporte e locomoção, como os próprios postos de combustíveis, comércio de alimentos perecíveis, transporte de cargas e pessoas, atividades turísticas, a indústria em geral, produção e comércio de hortifrutigranjeiros.

 

Os efeitos imediatos serão amenizados com a volta da normalidade. Mas teremos os efeitos posteriores. O governo já anunciou que deverá promover a reoneração da folha de pagamento, a fim de compensar uma parte do que cedeu na negociação do preço do óleo diesel. A reoneração trará impactos para os setores têxtil, confecção, máquinas e equipamentos, mobiliário, calçados e outros ligados à indústria, aumentando o custo das empresas.

 

Mesmo que o governo negue quanto à criação ou aumento de outros impostos (exceto reoneração da folha), é fato que deverá ter uma origem do dinheiro desse desencaixe para poder cumprir o acordo com os caminhoneiros. O governo terá um gasto de cerca de 10 bilhões de reais até o final do ano, para subsídio do valor do diesel, a fim de não prejudicar a Petrobrás. Obviamente que o governo poderia reduzir seus gastos, para fazer frente à esse acordo, mas sabemos que na prática é muito difícil. Pode-se até ter redução de verbas, principalmente em corte de investimentos, pelo qual poderemos sentir em paralisação de obras ou atrasos na entrega das mesmas.

 

A conta vai vir...

 

Economistas preveem um aumento dos preços, visto a escassez de produtos e o tempo de espera para normalizar o fornecimento. Haverá empresas que tentarão compensar as perdas que ocorreram através da correção de seus valores, visto que seus custos aumentarão. O estoque de perecíveis ainda vai demorar para ser normalizado. Menos mal que o aumento pode ter efeito temporário, mas até que ponto os preços se estabilizarão depois?

 

Ainda é difícil prever o impacto na economia como um todo, mas analistas preveem que o PIB (Produto Interno Bruto) de 2018 já sofra revisão para baixo, onde de uma previsão de 2,5% no ano, passe para 2,37% ao ano (Boletim Focus de 28/05/2018). O país estava retomando aos poucos a atividade econômica, e recebeu um balde de água fria (mais um).

 

Por outro lado, não se acredita em demissões em massa, visto que foi um evento momentâneo, mas as empresas sentirão no caixa, pois ainda pode levar alguns dias até voltar à normalidade. Além do aumento de preço de insumos, poderá haver maior inadimplência dos clientes, visto que empresa parada, não fatura e não gera caixa.

 

O que fazer nesse pós greve, com previsão de aumento da inflação?

 

Agora torna-se cada vez mais importante a empresa rever seus custos, tanto em valores como processos, além de ampliar opções de fornecedores. Se realmente haver um acréscimo relevante no custo das matérias-primas e demais gastos, a empresa poderá até absorver uma parte, mas é inevitável que seja repassado algum valor para seu cliente.

 

As empresas que possuem fluxo de caixa, ou seja, disponibilidade de caixa (que em períodos bons toda a empresa deveria fazer uma reserva de emergência), estarão mais confortáveis, visto que não vão necessitar buscar recursos em instituições financeiras, ou talvez busquem menos. Nesses momentos pode ser usado o fluxo de caixa para comprar insumos por um custo menor, devido ao pagamento a vista ou barganhar pela quantidade (deve ser analisado se vale a pena), ou até para financiar seus clientes (vender a prazo, podendo ser um diferencial competitivo perante a concorrência), ou ainda para manter a operação nesses momentos de baixa.

 

Para empresas que já vinham com dificuldade de caixa, infelizmente esse cenário não é nada bom. Será necessário que a empresa negocie com seus fornecedores, principalmente em relação à prazo de pagamento, pedindo prorrogação ou negociação de novos prazos, e utilizar o crédito que tem no mercado. É importante engajar a equipe de colaboradores e pedir o apoio, para passar por esse período turbulento.

 

Nós, consumidores, sofreremos as consequências na ponta. Provavelmente pagaremos mais na aquisição de produtos e serviços, principalmente no supermercado. O que nos resta é controlar nossos gastos (ainda mais ) e pesquisarmos preços.

 

Por fim, apesar de efeitos indesejáveis sobre a economia, e sendo ainda previsões superficiais (e até espero que esteja errado nessas previsões), espera-se que a greve ou o protesto traga resultados positivos, no sentido de provocar uma revisão da política de preços de combustíveis, bem como revisão da carga tributária e uma consciência melhor do tamanho da fatia que o governo leva na produção de bens e serviços, em comparação ao que é devolvido para a sociedade.

 

 

Fabio Nepomoceno - Contador e Consultor em Finanças

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